Atualmente a Reforma Tributária no Brasil é um dos temas mais relevantes do nosso país e está promovendo mudanças profundas que impactam diretamente o planejamento sucessório.
As alterações nas regras tributárias, especialmente sobre heranças, doações e rendimentos, tornam imprescindível a revisão das estratégias para transmissão de bens entre gerações. Este artigo explora as mudanças, analisa os impactos no planejamento sucessório e apresenta soluções embasadas na legislação para minimizar riscos e proteger o patrimônio familiar.
Mudanças nas alíquotas do imposto incidente sobre o Planejamento Sucessório
O planejamento sucessório é uma ferramenta essencial para organizar a transmissão de bens, evitar conflitos familiares e mitigar impactos financeiros.
Antes da reforma, o planejamento já enfrentava desafios significativos devido à incidência de tributos como o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD), imposto devido quando da sucessão decorrente de falecimento e em casos de doação.
Com o advento da reforma tributária, esses desafios aumentaram, haja vista que antes da reforma os estados poderiam optar em utilizar alíquotas fixas ou progressivas .
Atualmente, 9 estados aplicam a alíquota fixa que varia entre 2% a 6% a depender do estado, enquanto os os demais estados e o DF utilizam alíquotas progressivas que podem atingir até 8%, com exceção do Piauí que é o único a utilizar alíquota mista, com valor fixo para doação e progressivo para herança.
Com a reforma tributária, essa autonomia dos estados para a definição das alíquotas foi retirada, de forma que agora os estados deverão adotar a alíquota progressiva em todo o país.
Essa mudança pode resultar no contribuinte pagando até 3 vezes mais do que ele pagaria antes da reforma, trazendo um impacto direto para o bolso dos contribuintes. Essa progressividade impactará principalmente aquelas famílias que possuem patrimônios expressivos, uma vez que quanto maior o patrimônio a ser transmitido mais alta será a alíquota.
Possível Aumento das Alíquotas
A proposta de majoração das alíquotas do ITCMD (Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação) de 8% para 16%, que está em trâmite no Senado Federal (Projeto de Resolução do Senado n.º 57/2019), tem gerado discussões acaloradas sobre seus impactos econômicos e sociais.
O ITCMD é um imposto estadual que incide sobre heranças e doações, e sua alíquota varia conforme a legislação de cada unidade da federação. A alteração proposta visa aumentar a arrecadação do governo federal e oferecer mais recursos para áreas como saúde e educação.
No entanto, a proposta de duplicar a alíquota tem gerado preocupações, especialmente entre as famílias de classe média e alta, que seriam diretamente afetadas pela elevação, o que pode resultar em um aumento da carga tributária e no planejamento sucessório das famílias.
Por outro lado, defensores da mudança argumentam que o aumento da alíquota é uma medida necessária para reduzir desigualdades sociais, uma vez que as grandes fortunas, muitas vezes, não são suficientemente tributadas.
A elevação do imposto poderia garantir mais justiça fiscal, destinando recursos para políticas públicas essenciais. Contudo, é importante ressaltar que a medida precisa ser cuidadosamente discutida, considerando os efeitos sobre o mercado imobiliário, o processo de sucessão familiar e a possível fuga de recursos para outros estados com alíquotas mais baixas.
A proposta está gerando um debate sobre o equilíbrio entre justiça tributária e o impacto na economia, e é fundamental que a decisão final leve em conta uma análise profunda desses aspectos.
Base de cálculo mais rigorosa
O PLP 108/24 - que regulamenta a reforma tributária, traz novas regras para aplicação da base de cálculo do ITCMD sobre a transmissão de quotas e ações de empresas.
De acordo com o projeto de regulamentação, a base de cálculo deve ser definida com uma metodologia "tecnicamente idônea", levando em conta, no mínimo, o patrimônio líquido da pessoa jurídica, ajustado pela avaliação de seus ativos e passivos a valor de mercado.
Esse critério exige uma avaliação mais precisa e realista do valor da empresa, o que pode aumentar a complexidade do processo de apuração do imposto.
Para a transmissão de participações em empresas com ativos substanciais, como imóveis ou participações em outras companhias, é uma incógnita como cada estado irá chegar a conclusão de tal valoração, haja vista que para se chegar ao valor almejado, há necessidade de avaliações detalhadas para determinar o valor de mercado, o que pode gerar custos adicionais com auditorias e avaliações independentes.
Além disso, o PLP determina que o valor de mercado do fundo de comércio também deve ser incluído na base de cálculo, conforme estabelecido pela legislação do ente tributante.
Isso implica que, em transmissões de ações ou quotas de empresas, o valor intangível — como a marca, a clientela ou a reputação da empresa — será incorporado ao cálculo do ITCMD.
Para empresas com uma forte presença de mercado ou que possuem um fundo de comércio significativo, isso pode resultar em uma base de cálculo maior, e, consequentemente, uma carga tributária mais elevada.
A inclusão do valor de mercado do fundo de comércio pode aumentar a complexidade do processo de sucessão ou doação, exigindo uma maior precisão na avaliação dos ativos intangíveis, o que pode gerar novos desafios para os herdeiros e donatários, além de exigir maior controle e fiscalização por parte dos estados.
Demais implicações relevantes trazidas pela Reforma Tributária
Não obstante as alterações já apontadas, a regulamentação da reforma tributária proposta pelo PLP 108/24 traz diversas implicações para a tributação de ativos e operações, afetando principalmente áreas como planos de previdência, transmissões internacionais e a gestão de dívidas.
Uma das principais mudanças é a tributação dos planos de previdência VGBL e PGBL pelo ITCMD (Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação), que embora tenha sido barrada na regulamentação, poderá ser instituída quando da regulamentação dos estados, haja vista que não depende de lei complementar.
Isso exige que os detentores de planos de previdência considerem novas estratégias de planejamento sucessório para minimizar os impactos fiscais.
Outro aspecto relevante da reforma diz respeito às transmissões internacionais. Antes da mudança, não havia autorização constitucional para a cobrança do ITCMD em transmissões de bens ou valores para o exterior, o que limitava a tributação apenas a bens localizados no Brasil.
Com a reforma, os estados passam a ter permissão para aplicar o ITCMD também sobre transmissões internacionais, o que pode gerar desafios para famílias com ativos fora do país. A tributação de bens situados no exterior, especialmente em heranças ou doações, agora estará sujeita às alíquotas do ITCMD, o que pode resultar em um aumento significativo da carga tributária, considerando que essas alíquotas podem ser superiores às taxas de impostos vigentes nos países de origem dos bens. Isso exige um planejamento sucessório mais cuidadoso para minimizar os impactos fiscais nas transmissões internacionais.
A regulamentação da reforma também busca estabelecer novas regras para as holdings imobiliárias, prevendo que o imposto será devido no local onde os bens estão situados, ao invés de ser tributado na sede da holding. Isso pode causar um impacto nas estratégias de planejamento tributário de empresas que possuem imóveis em diversas regiões ou estados, pois a mudança pode resultar em uma tributação mais alta em locais com alíquotas mais elevadas de ITCMD.
Outras implicações incluem o perdão de dívidas, que passará a ser considerado como uma doação, sujeitando-se à tributação do ITCMD, e a transferência onerosa sem lastro, que pode ser caracterizada como uma operação de doação disfarçada, também sendo tributada de forma mais rigorosa. Essas mudanças trazem um aumento da complexidade no planejamento sucessório e tributário, exigindo uma maior atenção dos contribuintes e a necessidade de reestruturar as operações de gestão de patrimônio para minimizar a carga tributária.
Mas nem tudo é negativo, a reforma tributária também traz uma mudança positiva para os contribuintes ao permitir a dedução das dívidas na base de cálculo do ITCMD. Essa medida favorece as pessoas que, ao transmitirem bens ou direitos, possuam obrigações financeiras associadas a esses bens. A dedução das dívidas significa que o valor a ser tributado será reduzido, considerando a existência de passivos que devem ser descontados do valor total da herança ou doação. Isso pode resultar em uma carga tributária mais baixa para os herdeiros ou donatários, pois o imposto será calculado apenas sobre o valor líquido do patrimônio, ou seja, após a compensação das dívidas, o que representa uma forma de aliviar a pressão fiscal em situações de sucessão de bens com obrigações financeiras pendentes.
Estratégias para Adaptação ao Novo Cenário
Diante das mudanças, é fundamental revisar estratégias de planejamento sucessório, priorizando soluções que mitiguem os impactos da reforma tributária. Entre as alternativas possíveis, mesmo com a mudança que esse cenário vai sofrer, o planejamento antecipado ainda é uma excelente alternativa, principalmente antes das implementações da reforma.
De toda forma, mesmo com as mudanças que estão por vir, o uso de ferramentas de planejamento sucessório, como doações, diluições e testamentos, continua sendo uma medida importante, especialmente para famílias que possuem patrimônio relevante.
Manter o controle sobre a situação é sempre a melhor alternativa, seja ao optar por realizar doações e elaborar testamentos, seja ao decidir, de forma estratégica, quais bens deverão ser inventariados.
O que não se pode é deixar o acaso e as constantes mudanças legislativas, que implicam diretamente na forma e valor das transmissões patrimoniais ditar as regras, sob pena de ter o patrimônio dilapidado, seja decorrente da corrosão da carga tributária, ou das eventuais questões familiares, que também podem diluir o patrimônio.
Conclusão: Planejar para Preservar o Patrimônio
A Reforma Tributária representa um marco transformador no planejamento sucessório no Brasil, exigindo uma revisão estratégica para proteger o patrimônio e mitigar os impactos das novas regras.
Alterações como a unificação das alíquotas do ITCMD, a possível tributação de dividendos e a eliminação de isenções, especialmente para holdings familiares, tornam essencial uma abordagem mais técnica e proativa.
A integração dos instrumentos utilizados no planejamento sucessório com as novas exigências legais e tributárias assegura a continuidade de negócios familiares e a preservação do patrimônio de geração em geração.
Com base em um sólido embasamento jurídico, o planejamento sucessório pós-reforma deve priorizar soluções que equilibrem eficiência fiscal, conformidade com a legislação e objetivos familiares de longo prazo, reafirmando sua importância como ferramenta indispensável para a gestão e transmissão de patrimônio no Brasil.