Na última semana, o Supremo Tribunal Federal declarou inconstitucionais dispositivos da Lei nº 7.850/2002, do Estado de Mato Grosso, que autorizavam a cobrança do ITCMD em doações e heranças envolvendo bens localizados no exterior. Embora o julgamento tenha analisado especificamente a norma mato-grossense, o Tribunal reafirmou entendimento já consolidado: sem lei complementar federal, os Estados não podem disciplinar isoladamente essa matéria.
A Constituição Federal, em seu artigo 155, §1º, inciso III, condiciona a instituição do ITCMD-Exterior à edição de lei complementar federal. Essa exigência, reorganizada pela Emenda Constitucional nº 132/2023, preserva sua essência: apenas o legislador federal pode estabelecer critérios de conexão e disciplinar a incidência do imposto em transmissões internacionais.
Tentativas estaduais e limites da tributação de heranças no exterior
Apesar da clareza constitucional, alguns estados editaram leis para tributar heranças e doações internacionais. A justificativa era suprir a omissão do Congresso e preservar arrecadação. No entanto, essas leis sempre nasceram inconstitucionais, pois extrapolaram os limites da competência estadual.
O STF, ao julgar o caso do Mato Grosso, reforçou esse entendimento. Não se trata de decisão com efeito vinculante sobre todo o país, mas de reafirmação da interpretação constitucional que já vinha sendo adotada pela Corte em casos semelhantes.
Assim, o recado é inequívoco: enquanto não houver lei complementar, a tributação pelo ITCMD em transmissões internacionais permanece inviável, ainda que estados tentem legislar de forma autônoma.
Consequências práticas da decisão
Na prática, o julgamento mantém a proibição da cobrança. Enquanto não houver lei complementar em vigor, os estados não podem exigir ITCMD sobre transmissões de bens no exterior.
Esse cenário oferece uma oportunidade temporária de segurança jurídica a famílias e empresas com patrimônio internacional ou que pretendam ter. Além disso, abre espaço para pleitos de restituição de valores pagos indevidamente com base em leis estaduais inválidas.
Entretanto, a decisão não elimina riscos futuros. A aprovação de lei complementar pelo Congresso mudará o quadro jurídico e permitirá a tributação, ainda que somente para fatos posteriores à sua entrada em vigor.
PLP 108/2024 e o futuro da tributação de heranças no exterior
Nesse contexto, o Projeto de Lei Complementar nº 108/2024 ganha protagonismo. Já aprovado no Senado e em análise pela Câmara, o texto busca preencher a lacuna normativa.
O projeto define critérios como domicílio do doador ou do herdeiro e localização dos bens. A intenção é uniformizar a cobrança e dar segurança aos estados.
Contudo, a simples aprovação da lei não encerrará as disputas. Critérios concorrentes de conexão podem gerar novos litígios entre estados, além de conflitos com sistemas tributários estrangeiros. Assim, o PLP pode inaugurar uma etapa de maior complexidade, mesmo ao oferecer a base legal exigida pela Constituição.
Conclusão: agir no intervalo estratégico
O julgamento do STF reafirma uma limitação constitucional já conhecida: estados não podem, de forma autônoma, tributar transmissões internacionais sem lei complementar. O Congresso, por sua vez, avança para suprir essa ausência normativa.
Para famílias empresárias e investidores, o momento atual constitui um intervalo estratégico. Decisões tomadas agora — como reorganizações patrimoniais e sucessórias — podem representar significativa economia ou, em caso de inércia, maior exposição futura.
A Melo Advogados Associados acompanha de perto essas movimentações legislativas e jurisprudenciais e está preparada para orientar clientes na adoção de estratégias seguras em sucessões internacionais e governança tributária.